Em 28 de julho foi instituído o Dia mundial de luta contra as hepatites virais. A data reforça a importância da prevenção e controle dessa doença que tem aumentando o número de casos em todo o mundo. A hepatite é uma inflamação do fígado, que pode ser provocada por vírus, remédios, drogas, álcool, doenças autoimunes, metabólicas e genéticas. Por ser uma doença silenciosa e que possui sintomas semelhantes a outras doenças comuns, nem sempre é diagnosticada com precisão. Confira a matéria sobre a Hepatite medicamentosa, escrita pela infectologista Raquel Tozzo, para o MNCP.
O fígado é um órgão com múltiplas funções e o processamento de substâncias estranhas que os seres humanos entram em contato faz parte delas. Nesse sentido, ele é responsável pela retirada de componentes tóxicos e pela excreção de fármacos e de outras substâncias que podem penetrar no organismo, como o álcool e a cocaína. Em condições patológicas esse processamento de substâncias pelo fígado leva à lesão e morte das células hepáticas por motivos ainda não completamente esclarecidos. Tal dano hepático por fármacos ou outras substâncias pode ser chamado de hepatotoxicidade e desencadeia um processo inflamatório. A hepatite medicamentosa seria a inflamação do fígado desencadeada por medicações (fármacos).
Sabe-se que a chance de desenvolver tal inflamação é maior com o avançar da idade, assim adultos e idosos são mais vulneráveis do que crianças. O sexo feminino também é mais afetado sendo que a causa disso ainda não foi esclarecida.
Há pessoas com predisposição genética à hepatite medicamentosa em relação a fármacos e substâncias específicas. Por outro lado, existem substâncias que induzem o fígado à inflamação, como o álcool e a cocaína. O álcool altera a forma como as células hepáticas lidam com alguns fármacos, sensibilizando-as à lesão. A cocaína leva à redução do calibre dos vasos hepáticos, que é maior quanto maior for a dose utilizada, resultando também em lesão para o fígado.
Doenças hepáticas pré-existentes devido aos vírus das hepatites virais, à infiltração gordurosa hepática, ao etilismo, entre outros, podem potencializar a toxicidade de algumas substâncias tornando mais fácil a ocorrência da hepatite.
Outro fator importante nesse contexto é o uso simultâneo de vários fármacos, o que é comum em doenças crônicas, como a aids avançada. Nesse cenário, várias doenças oportunistas podem coexistir, exigindo medicações específicas, o que leva a um risco maior de hepatotoxicidade. Seguimento clínico e laboratorial em intervalos curtos de tempo são essenciais para o diagnóstico e tratamento da hepatite medicamentosa, caso ela venha a aparecer.
No caso de PVHA com diagnóstico precoce e/ou que ainda não desenvolveram infecções oportunistas, a ocorrência de hepatite medicamentosa associada aos antirretrovirais não é algo comum, principalmente se houver controle de comorbidades como etilismo e hepatites virais. Cabe ressaltar, ainda, que os exames laboratoriais periódicos realizados por PVHA são fundamentais para a detecção precoce e tratamento de possível hepatotoxicidade.
Pode-se dizer que a hepatite medicamentosa é um evento raro e que situações específicas convergem para que ela ocorra. Algumas dessas situações são controláveis, como o uso de álcool e drogas. Outras são passíveis de diagnóstico e tratamento, como as hepatites virais. E, de modo geral, para aquelas condições não possíveis de serem modificadas (gênero, idade, fatores genéticos) há o seguimento clínico e laboratorial regular, mandatório para os portadores de doenças crônicas. Assim pode-se, na grande maioria dos casos, realizar o diagnóstico precoce e instituir o tratamento apropriado que se baseia na identificação e retirada da substância que está levando ao dano hepático.
Raquel Tozzo, CRM 104146, Médica Infectologista, Graduação e Residência na Universidade Estadual de Campinas-SP. Local de trabalho – Cr IST, AIDS, Hepatites Virais Campinas-SP.
Fontes: Guyton e Hall -Tratado de Fisiologia Médica (12ª. Edição); Cecil Medicina (23ª edição); Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Manejo da Infecção pelo HIV em Adultos – 2018.