A 1ª Mobilização Nacional do MNCP – Em Defesa da Vida, em alusão ao Dia Internacional da Mulher, vem abordando, ao longo do mês de março, a importância da conscientização e participação social das mulheres. 

Para as cidadãs positHIVas é imprescindível que as mulheres ocupem cargos públicos e privados ampliando sua atuação nos espaços de poder e decisão, reduzindo todas as formas de desigualdades sociais, econômicas, ambientais e políticas, sem esquecer do combate à violência e o acesso integral a saúde. Portanto, o tema abordado reflete a importância do momento e coloca em evidência os desafios para a construção, efetivação e manutenção das políticas para as mulheres. 

Acompanhe a matéria feita com três mulheres empoderados do Movimento Nacional das Cidadãs PositHIvas e Rede Feminista de Saúde que ocupam espaços importantes na sociedade. 

 Maria do Espírito Santo T. dos Santos – Santinha 

Médica Sanitarista, atuando na Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro.  Membro do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital dos Servidores do  Estado RJ.  Atual Presidente do Comitê Estadual de Prevenção e Controle de Morte  Materna e Perinatal RJ.  Membro do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher CEDIM/RJ. Maranhense, feminista, membro da Rede Nacional Feminista de Saúde,  Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos.

Em 1975, no Rio de Janeiro, foi criado o Centro da Mulher Brasileira, primeira entidade  feminista do Brasil. Mulheres diversificadas se encontravam semanalmente, se  conheciam e compartilhavam interrogações e interesses em busca de liberdade,  igualdade, espaços de crescimento e visibilidade na sociedade. Mulheres querendo  viver. 

Partimos para o conhecimento das políticas públicas destinadas às mulheres e, na  área de saúde, detectamos no Ministério da Saúde a existência do Programa Materno Infantil, no qual o corpo da mulher era visto apenas em sua função reprodutiva, onde  a maternidade representava seu papel prioritário. Tínhamos clareza que era  necessário a mudança para um programa em que a mulher pudesse ser vista em sua  totalidade. 

A mobilização aconteceu de imediato, mulheres presentes em vários espaços,  estados, movimentos sociais, universidades, etc foram elaborando o Programa de  Atenção Integral á Saúde da Mulher reconhecido e formalizado em 1983 pelo MS. O  PAISM apresentou uma visão da Saúde da Mulher, com conteúdos, instrumentos e 

tecnologias inovadoras, possibilitando o reconhecimento e inclusão das ideias feministas nos espaços de debate das políticas de saúde. Possibilitou ainda que muitas profissionais da área atuassem na sua execução dentro do MS, além da  inclusão das feministas entre os fundadores do SUS. 

Outros espaços conceituais e organizacionais foram trabalhados na década de 80. A  discussão da igualdade passava por aprofundar o direito à sexualidade, ao domínio  de nosso corpo e a livre opção pela maternidade. Muitas passeatas foram realizadas com o a bandeira “Nosso Corpo nos Pertence”. Ao mesmo tempo nossa denúncia sobre a violência, presente em todos os espaços da vida da mulher, passou a  repercutir de forma mais intensa na sociedade, nos meios de comunicação e na área  política. Assim, em 1985 foi criado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e se  iniciou a multiplicação dos conselhos estaduais dos direitos da mulher e as delegacias  especializadas em direitos da mulher começaram ser implantadas.  

No período posterior foram realizadas Conferencias Nacionais, Estaduais e Municipais  sobre a saúde da mulher, das quais emergiu um elenco de propostas e reivindicações  que pressionaram a criação de políticas públicas para as mulheres, que resultaram na  transformação do PAISM em uma Política de Estado em defesa da saúde da mulher pelo MS em 2004. 

A luta que se seguiu representa a nossa pressão permanente para a implantação  plena da diretrizes da agora Política de Atenção Integral à Saúde da Mulher, torna-la uma realidade em nosso quotidiano, se contrapondo às inúmeras resistências  culturais, políticas e ideológicas discriminatórias à mulher, que ainda predominam no  país. 

Quando lutamos pelo controle de nosso corpo, inclusive na livre opção de levar a  termo ou não uma gravidez, através da descriminalização do aborto, encontramos  resistências poderosas, que se agudizam no atual momento de indigência intelectual  na esfera governamental, no crescimento de denominações religiosas oportunistas  que negam a possibilidade da mulher ser mais que mero elemento de reprodução, desempenhando papel secundário na família, sociedade e estado. 

Cleide Jane Figueiró

Representante do MNCP no Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres, Presidente Amires 

Estar em uma posição de referência automaticamente nos leva, a não somente enxergar a outra pessoa, mas a OLHAR, e esse olhar tem que ser diferenciado, tem que vir da alma, principalmente se essa pessoa for uma mulher.

Não me fiz líder, referência …me fizeram.

Quando olho ao redor, no meu território de atuação, quando me chamam pelas redes sociais, vejo a responsabilidade do cuidado, do repasse correto das informações, de me colocar como escudo, portal, dar a mão e ajudar na caminhada.

Não consigo ficar ausente diante das situações. As mulheres até as ditas politizadas, empoderadas também precisam de ajuda, de apoio, carinho,  atenção, do olhar.

Vielas, becos, morros não me intimidam, não me travam, não me param, não me silenciam. Onde sou requisitada, onde eu sinalizo, onde o vento me conta eu estou lá.

Nessas andanças e vivências aprendi que é preciso ocupar espaços, onde se discutem as políticas públicas que interferem diretamente em nossas vidas e em nossos corpos.

Ocupei conselhos de direito a nível municipal de saúde, da assistência, da criança  do adolescente, fórum da mulher, do deficiente. A nível estadual, a Secretaria Executiva do fórum de Ong/ AIDS RJ, Comissão Estadual de AIDS, atualmente estou na Comissão de Saúde Mental do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e no Conselho Nacional da Mulher representando com muito orgulho e honra o MNCP.

No início da pandemia, chorei com muitas compas. Vi mulheres sendo despejadas, esperando a quentinha da igreja, caindo em depressão extrema e a mídia, só falando não saiam de casa, se protejam, fiquem em casa. Isso não entrou na minha mente!

Apenas um mês fechei as portas. Depois conversei com a equipe, nos revezamos em plantão e reabrimos.

Foram comprovadamente assistidas mais de 800 mulheres com cestas básicas, material de higiene e limpeza, álcool gel, máscaras, apoio psicológico, jurídico, moradia solidária, fraldas geriátricas e infantil, leite e etc.

Trabalhamos duro e ninguém ficou doente, tomamos todas as medidas preventivas e não abandonamos ninguém, nenhuma mulher que precisou de cuidados ficou para trás.

Às vezes bate o cansaço, mas a missão tem que continuar.

Trago sempre a frase do Pequeno Príncipe, “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”, e o louvor gospel do cantor Jessé Aguiar “Alívio” revigora minha alma e me faz seguir em frente com forças por mim e pelas outras/os, pelo legado que vou deixando para meus filhos, meus netos e amigos. 

Renata Souza

Assistente Social, representante do MNCP no Conselho Nacional de Saúde

“O corpo feminino é um território que é perpetuada a pedagogia da crueldade, que fornece as bases de sustentação do poder”. Rita Laura Segate.

A entrada feminina no mercado de trabalho, assim como o direito ao voto foram conquistas adquiridas ao longo dos anos para todas as mulheres, a partir de muitas lutas e de organização social conjuntara. 

Infelizmente, as mulheres ainda têm dificuldades para ocupar cargos predominantemente masculinos e lutam para ganhar salários iguais aos dos homens.

Na política, a desigualdade também se perpetua com pouca representatividade para o quadro feminino e mínima representatividade para o gênero. 

O Conselho Nacional de Justiça aponta em pesquisa que o número de mulheres no comando de prefeituras é de apenas de 11,8% , dos 5570 municípios do País.

Se analisarmos o número de mulheres no mundo e a quantidade de eleitas que ocupam cargos políticos é possível verificar a baixa representatividade feminina nos espaços decisivos e de construção de políticas públicas.

As políticas voltadas para as mulheres são construídas há muitos anos por homens, e vem de encontro aos interesses destes homens.

 Além do que uma maior representação feminina é uma forma de empoderamento, tornando as mulheres mais próximas dos assuntos e das decisões cotidianas com condições de  debater e decidir sobre diversas pautas  que versam  sobre sua vida e seus corpos.

Quando se fala em cargos de gestão ou de pesquisa, as mulheres estão em situação de coadjuvantes com relação ao número de homens atuando, e enfrentam obstáculos diversos para ocupar cargos mais elevados.

 Infelizmente ainda existe muito preconceito quando se trata da presença feminina na política e o quanto é importante estimular a participação das mulheres, colaborando para ampliar  esta participação nos espaços de construção política e  de Controle Social.

Em 2010, o Tribunal Superior Eleitoral reformulou a lei e tornou obrigatória 30% de participação das mulheres na política como candidatas, sendo uma cota mínima exigida. No entanto, os partidos ainda têm dificuldades em atrair as mulheres para seus cargos.

Torna-se imprescindível dar voz às mulheres indígenas, negras, rurais, jovens, LGBTQI+  e promover mais igualdade, contribuindo assim para a redução do estigma e do preconceito latente nestes espaços majoritariamente masculino.

Com a criação da  Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher, alguns desafios foram apresentados e debatidos, e por este motivo  é fundamental pensar e produzir ações  observando as necessidades reais das mulheres e não somente de uma parte delas..

Algumas demandas antigas, como a criminalização do aborto, e o atual debate sobre a necessidade de distribuição de absorvente higiênico para as mulheres em situação de vulnerabilidade e risco social, demonstra que as pautas femininas  fazem  parte da realidade politica e nem sempre caminham  com a devida importância em muitos estados e municípios.

Já reconhecemos que precisamos coletivamente ampliar a rede de apoio para as mulheres que residem em áreas mais precárias e expandir de forma significativa as redes de atendimento, dando acesso para aquelas que possuem menos recursos financeiros a buscar ajuda quando necessário.

Tornou se visível o quanto a insegurança alimentar aumentou drasticamente nos últimos  dois anos em função da pandemia da COVID 19 e de outros agravos, com ela  o aumento expressivo da violência doméstica entre as mulheres pretas e pardas, tornando a saúde mental ainda mais comprometida, situação que nos remete ao racismo institucional e estrutural.

A violência obstétrica também esteve presente na vida das mulheres e mais ainda na vida das mulheres pretas, pauta frequente nos espaços da mídia e nas discussões coletivas atuais.

 Precisamos enquanto sociedade civil organizada avançar nas discussões destas demandas nos mais diversos espaços, porque a vida de todas as mulheres importam e para isso conclamar de forma organizada as mulheres para se unir  contra as violações de seus direitos.

 Somos diversas em nossas características, por vezes temos isso usado como justificativa para a negação do que é óbvio, o direito à vida.

A consequência de tudo que nos ocorre, nos faz impedidas da percepção sobre a violência sofrida, seja pela falta de acesso à informação  ou pelo descrédito que é comum a todas as mulheres. 

Enquanto ainda não for problematizado o fato de que mulheres não ocupam os mesmos espaços que os homens e enquanto a nossa ausência for desconsiderada, não teremos ferramentas de luta  e de mobilização para reconhecer as diversas violências e suas formas. 

Como pensar e construir sobre a diversidade de mulheres se todas não estiverem presentes  propondo formas de criar uma nova realidade?

A informação e a comunicação são  importantes para que este movimento siga vivo e em constante exercício.

Incluir as mulheres nos espaços de Controle Social, de criação das políticas públicas bem como nos espaços políticos garantem que as mulheres tenham visibilidade colaborando na criação de políticas para além do binômio mãe e filho.

Contribuir para a inserção de mulheres nestes espaços é dar condições para que todas venham  propor ações para os  diversos ciclos de vida, realizar trocas, reconhecer demandas , refletir sobre as desigualdades, ideias e novas possibilidades.

As mudanças necessárias somente acontecerão com o aumento da consciência política sobre a consequência na vida das pessoas e de educação política.

Com relação à minha experiência nos espaços de controle social, há muitos anos tive o privilégio de receber formação em controle social por meio de financiamento de um projeto para formação de conselheiros municipais, e foi o que me despertou para a participação política  nos conselhos e nas conferências.

Foi participado dos conselhos de saúde, da pessoa com deficiência e da segurança alimentar que aprendi que a luta é realizada de forma coletiva e que a participação da sociedade nas políticas públicas é promovida por diferentes meios, nas esferas  legislativa, executiva e judiciária.

Atuar nos espaços de construção de políticas públicas, tais como o Movimento  Nacional das Cidadãs Posithivas, a UNAIDS e Conselho Nacional de  Saúde, é  estar de posse do exercício da cidadania como um instrumento,  a partir de uma construção dinâmica e cotidiana que acontece a partir da retroalimentação por meio dos nossos pares  sob a influência da atual conjuntura política.

Estar representando a sociedade civil organizada  em espaços  de diálogo com o poder público, é ter consciência do nosso papel enquanto cidadão,  na construção de políticas públicas,  na formação de novos militantes, na organização dos movimentos sociais.

Participação social é a  busca por soluções para as causas que acreditamos, é abrir caminho para que outras mulheres se reconheçam como atrizes de sua própria construção histórica, pelo direito à saúde pública , integral e de qualidade.

I Mobilização Nacional do MNCP – Em defesa da vida e das Políticas Públicas com qualidade 

#EmDefesadaVida 

Secretaria NacionaL  do MNCP