Infecção pelo HIV controlada, carga viral suprimida, imunidade estabilizada, resultado de boa adesão aos antirretrovirais, mas….

A ação direta ou indireta do vírus, os efeitos colaterais dos antirretrovirais, o estilo de vida e fatores genéticos predispõem a pessoa com HIV a algumas comorbidades. Entre elas, as doenças reumatológicas. 

A Coordenadora da comissão de artrite reumatoide da Sociedade Brasileira de Reumatologia,  Dra. Karina R. Bonfiglioli, nos explica nesta entrevista, a relação entre o HIV e Doenças Reumatológicas. Acompanhe.

MNCP: Existe uma relação entre o HIV e Doenças Reumatológicas?

Dra. Karina: Sim. Como o HIV promove um desbalanço no sistema imunológico, ele pode desencadear doenças auto imunes em pacientes que tenham predisposição genética para essas doenças. 

Algumas doenças reumáticas são “autoimunes” (ou imunomediadas, termo de referência atualmente). Isso significa que o sistema imunológico passa a atacar o próprio corpo, as articulações e outros órgãos. 

 Alguns exemplos de doenças reumáticas imunomediadas (sigla: DRIM) são: Artrite reumatoide, artrite psoriásica, espondilite anquilosante, lúpus eritematoso sistêmico, polimiosite, dermatomiosite, esclerose sistêmica. São doenças crônicas, isso é: não tem cura, mas tem controle e podem entrar em remissão. 

 Para manifestarem-se, essas doenças precisam de fatores genéticos (o paciente já nasce com eles) e de fatores ambientais,  que variam para cada doença. Alguns fatores conhecidos são: cigarro, infecções virais, infecções bacterianas, hormônios, exposição ao sol e a produtos químicos, entre outros)

 As infecções virais são um “gatilho” para doenças autoimunes, porque confundem o sistema imunológico e podem induzi-lo a atacar estruturas do próprio corpo. O HIV é um dos vírus que pode desencadear as DRIM. 

MNCP: Quais são as manifestações mais comuns? 

Dra. Karina: A infecção por HIV pode causar uma artrite associada ao próprio vírus, e não as doenças reumáticas. Somente o reumatologista e/ou o infectologista podem diferenciar a artrite do HIV e de uma DRIM, através de exames específicos. A artrite do HIV não é crônica e, em geral, responde bem a anti-inflamatórios e corticoides. 

A maioria das DRIM tem como manifestação mais comum a dor e inflamação nas articulações, por um período prolongado ( pelo menos 6 semanas). Podem acometer mãos, punhos, joelhos, pés, cotovelos, tornozelos. Em alguns casos, também a coluna.

Algumas doenças reumáticas podem afetar outros órgãos, como rins, sistema nervoso, coração e pulmões.

MNCP: Há tratamento? 

Dra. Karina: Cada DRIM tem um tratamento específico, mas a maioria utiliza corticoides e imunossupressores para o controle das manifestações. 

MNCP: Temos como evitar? 

Dra. Karina: Como as DRIM também dependem do fator genético, nem sempre é possível evitar. Mas existem algumas medidas que podem diminuir o risco:

– Manter baixa carga viral e contagem de LTCD4+ (seguimento com infectologista, utilizar o tratamento antirretroviral de forma regular)

– Estilo de vida saudável: evitar cigarro, excesso de exposição solar, adotar alimentação balanceada, prevenir novas infecções (entre elas DSTs) que podem ser gatilho para DRIM, manter peso adequado, praticar atividade física.

MNCP:  No corpo feminino as manifestações são as mesmas que no masculino? 

Dra. Karina: As mulheres têm maior tendência para quase todas as DRIM. Então estão sob maior risco de desenvolver doenças reumáticas, entre elas o Lúpus e a Artrite Reumatoide. Já os homens têm maior risco de desenvolver a artrite associada ao HIV, e também a espondilite anquilosante (que faz parte do grupo das DRIM). 

MNCP: Tem dicas para evitarmos as dores?

Dra. Karina: De forma geral, pessoas que estão no peso adequado, com bom condicionamento muscular, sofrem menos sobrecarga nas articulações e com isso têm menos dor. Porém, quando trata-se de DRIM, é preciso instituir tratamento adequado com acompanhamento de reumatologista. 

MNCP: Ao longo da vida e do tratamento com os antirretrovirais, podemos desenvolver diversas doenças reumatológicas, sendo as mais comuns aquelas que acometem os tendões, ligamentos, ossos, músculos, articulações e outras estruturas do sistema musculoesquelético, por essa razão é muito importante manter uma conversa aberta com seu médico infectologista pois ele poderá solicitar exames e te encaminhar ao especialista. Neste caso, um reumatologista.  Não deixe sua saúde para depois.

 

Dra. Karina R. Bonfiglioli

Assistente doutora da disciplina de Reumatologia- HC FMUSP

Coordenadora da comissão de artrite reumatoide da Sociedade Brasileira de Reumatologia