Nem sempre é fácil dar a volta por cima mas é a única saída…
Aos dezoito anos de idade, tinha acabado de completar meus estudos,“o ginásio” como se dizia naqueles anos. Trabalhava e estava amando quando de repente me vi grávida. Bem, o que eu sabia sobre gravidez? Sabia que se transasse no período fértil poderia engravidar, mas assim como toda adolescente, não sabia que os hormônios que causavam o desejo eram mais fortes que a razão e o auto cuidado, e fui pega pela tão temida gravidez na adolescência.
Hoje vemos diversas frases culpabilizando os jovens pelas relações sexuais desprotegidas, mas será que apenas “eu” me casei grávida, ou tive relações antes do casamento há anos atrás? Não, e ainda assim, não nos damos conta da importância da educação sexual nas escolas. Sem tabus, sem “incentivo ao sexo” como dizem, mas sim com informações que possibilitem as e os adolescentes a conhecerem seus corpos, escolherem o melhor momento pra iniciarem a vida sexual, saberem se proteger de infecções sexualmente transmissíveis, ter filhos nos momentos planejados e se desejarem, e por fim, se defenderem de abusos.
Bem, eu era jovem e mães aos dezoito anos. Meu casamento durou 14 anos e fui separada do meu então marido pela AIDS, e ai começa outra história… Mulher, trinta e poucos anos, com dois filhos, viúva e com HIV.E eram anos difíceis para todos que se infectavam naquele momento, a AIDS matava diuturnamente, sem remédios, sem esperanças, sem apoio, o que mais enfrentávamos eram os preconceitos e a discriminação.
Eu trabalhava em uma multinacional havia dez anos quando descobri que estava com HIV. Nesta fase, meu marido estava com tuberculose e seu estado de saúde era muito grave. Precisei contar na empresa sobe nossa situação e minha sorologia. Para minha surpresa, a empresa tinha uma política de prevenção e cuidados para os empregados com HIV na África do Sul e passei a receber os benefícios desta política. Não fui demitida, tive todo apoio humano e financeiro, além do meu salário, compravam para mim medicamentos que ainda não havia no Brasil, não fui exposta, mantiveram o sigilo sobre minha situação, até o momento que eu decidi falar, ter visibilidade e expor que estava infectada com o HIV. Fiquei viúva dois anos após o diagnóstico do marido. Comecei a frequentar o GIV- Grupo de Incentivo à Vida e ver o quanto o preconceito estava fazendo pessoas sofrerem e o quanto a desinformação estava infectando pessoas, principalmente mulheres, que como eu, sentiam-se seguras em relações estáveis.
Daí ao ativismo foi um pulo. Foram trinta anos trabalhando na mesma empresa e inúmeras palestras no local de trabalho. Aos poucos também falando para outras empresas e instituições. Participei de diversos programas de entrevistas na TV e na internet. Entrei para o MNCP- Movimento Nacional das Cidadãs PositHIVas, e ao me aposentar, foquei meu trabalho em ajudar mulheres, jovens e quaisquer pessoas que se descobrem com HIV. Continuo dando palestras em empresas, pois apesar de todo avanço na medicina, no tratamento e na melhoria da qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV, as empresas continuam sem saber lidar com o HIV e demitem seus empregados que contraem o vírus e as informam.
Sou mãe e criei meus dois filhos, dei a volta por cima, casei – me novamente, sou avó, aguardando a terceira ou terceiro neta/o. Sigo trabalhando, sou ativista, participo de uma maravilhosa Dança Circular Sagrada Feminino. Sexo frágil? Não… Não fugi á luta!
Silvia Almeida – Ativista, Consultora e Palestrante em Prevenção ao HIV/AIDS.