Pessoas que vivem com o vírus HIV, familiares e amigos realizaram na manhã de hoje (1º) um ato debaixo dos arcos da Lapa, no centro do Rio de Janeiro, lembrando o Dia Mundial de Luta contra a AIDS. A data foi instituída em 1988 pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
A mobilização foi realizada pela organização não governamental (ONG) Grupo Pela Vidda, que mobilizou pessoas de diferentes estados do país. Houve espaço para falas de ativistas e apresentações artísticas com grafiteiros que pintaram painéis com alusão à data.
Na praia de Copacabana, a Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual (CEDS-Rio) e a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) distribuíram kits de prevenção com camisinhas feminina e masculina, gel lubrificante e material informativo sobre a PEP (profilaxia pós-exposição) e a PREP (profilaxia pré-exposição).
Números
O Ministério da Saúde estima que 900 mil pessoas vivam com HIV no Brasil, sendo que 135 mil não sabem que estão infectadas. Nos últimos cinco anos, o número de mortes pela doença caiu 22,8%, passando de 12,5 mil, em 2014, para 10,9 mil, em 2018. Em todo o mundo, a ONU estima que cerca de 1,7 milhão de pessoas tenham sido infectadas ao longo do ano passado. A disseminação da doença, embora seja 16% inferior ao observado em 2010, preocupa o organismo internacional.
Uma recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) aos países é a busca da denominada meta 90-90-90, para garantir que 90% das pessoas que vivem com o vírus sejam diagnosticadas. Dessas, ao menos 90% precisam ter acesso ao tratamento. E 90% dos pacientes que estão tratando devem conseguir reduzir o vírus a níveis indetectáveis. Estudos apontam que a pessoa com carga viral indetectável não transmite o HIV.
Prevenção
Aos 66 anos, Francisco Dalton vive com o vírus há 38 anos e avalia que são necessárias mais medidas para fazer frente ao avanço da doença. Ele saiu de Belo Horizonte para participar do ato nos acros da Lapa e cobrar ações voltadas para a prevenção e o diagnóstico. Dalton acredita que a escola deva ser estimulada a discutir o assunto. “Quando você não previne, você terá um gasto maior com medicamento. Eu acho que um jovem bem informado é um agente de prevenção. O Brasil já foi líder mundial nas ações de prevenção. Hoje somos meros coadjuvantes”, diz.
As manifestações também tiveram questionamentos sobre decisões estruturais como a prevista no Decreto 9.795/2019, que substituiu o Departamento de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), AIDS e Hepatites Virais pelo Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. “Isso enfraqueceu a política de enfrentamento à AIDS e reduziu a visibilidade”, disse Maria Eduarda Aguiar, presidente do Grupo Pela Vidda.
Em nota publicada no site, o Ministério da Saúde garante que a mudança no regimento estrutural não prejudica a estratégia de respostas brasileira ao HIV e afirma que o orçamento destinado a este fim saltou de R$1,7 bilhão em 2018 para R$2,2 bilhões em 2019. A pasta argumenta que a alteração busca reordenar as ações e a tomada de decisão em favor da população, melhorando a gestão do SUS. “A reformulação foi identificada a partir de necessidades de implementar ações mais efetivas, eficientes e contemporâneas e está sendo realizada de forma a priorizar ações de assistência à saúde da população por meio das melhores evidências científicas e da incorporação das tecnologias que trazem benefício à população, sempre visando tornar mais eficaz o gasto público (…) As pessoas vivendo com HIV, por exemplo, têm maior risco de desenvolver a tuberculose, além de ser um fator de maior impacto na mortalidade nesses casos. Também é comum que o diagnóstico da infecção pelo HIV seja feito durante a investigação da tuberculose”, destaca o texto.
Cidadania
O Grupo pela Vidda foi fundado em 1989 pelo escritor, sociólogo e ativista Herberth Daniel. Devido a complicações decorrentes da infecção pelo HIV, ele faleceu aos 45 anos, apenas três anos após criar a entidade. A ONG foi idealizada para lutar por cidadania. “É um grupo que acolhe e mostra à pessoa com diagnóstico recente que ela tem vida, que não precisa se esconder. Não precisa ter vergonha. A vida continua. Temos o direito de viver e ser respeitado”, diz Francisco Dalton.
De acordo com Maria Eduarda, a entidade surgiu em um contexto onde as mortes eram muito mais frequentes. “A mortalidade atualmente é devido à não adesão ao tratamento e à falta de política pública. Naquela época, era por falta de tecnologia e medicamento. E além de existir a morte física, existia a morte civil. Havia um estigma social muito maior. Hoje ainda existe. Mas, antes, praticamente se decretava sua morte civil. Então o grupo nasceu para tentar conferir dignidade às pessoas”, lembrou.
Ela explica que a grafia Vidda, duplicando a letra d, ocorre por se tratar de uma sigla que significa valorização, integração e dignidade do doente de AIDS. “Mantemos o nome como resgate histórico do contexto daquela época. Mas hoje em dia não se fala mais em doente de Aids e nem em portador de HIV. Hoje se fala em pessoa vivendo com HIV/Aids para que ela não tenha de carregar o estigma de portar um vírus, mas que seja alguém com vida. Isso retira um pouco do estigma enfrentado no dia a dia”, diz.
Fonte: Agência Brasil