“O que faz mal é o HIV, não o remédio”, afirmou a infectologista Márcia Rachid durante uma sessão de perguntas e respostas sobre os efeitos dos antirretrovirais em mulheres que aconteceu no 8º Encontro Nacional das Cidadãs Posithivas. Segundo Márcia, os médicos estão acostumados a não escutarem e não pensarem individualmente em cada caso. Essa é razão pela qual tantos pacientes se sentem desconfortáveis com seus medicamentos e acabam não conseguindo aderir ao tratamento. “Os médicos precisam se preocupar com a saúde de forma ampla. Eu não cuido do HIV, cuido da pessoa. A individualização o tratamento é primordial para sua eficácia”, completa.
Durante o encontro, algumas mulheres relataram cortar os antirretrovirais ao meio para que as doses ficassem mais adequadas e provocassem menos reações em seus corpos. Outras afirmaram não tomar os medicamentos todos os dias também pelo mesmo motivo. As ativistas também reclamaram de efeitos comumente associados ao uso de antirretrovirais como acúmulo de gordura no fígado, lipodistrofia e problemas cardíacos.
Márcia defende que os novos medicamentos não provocam lipodistrofia. “Quem ainda toma AZT precisa pedir para o médico trocar, pois ele é quem causava a lipodistrofia. Hoje, o que pode acontecer é, no caso de quem toma efavirenz, haver acúmulo de gordura ao longo do tempo.”
A farmacêutica Ethel Ribas explicou que comprimidos revestidos não podem ser partidos. “Quando você parte o revestimento, o remédio será absorvido de uma forma sobre a qual não se tem controle, o que prejudica o efeito do antirretroviral. Pode ser que ele, inclusive, perca o efeito no organismo.” Ethel colocou que uma futura solução seja manipular antirretrovirais para que fique de acordo com a necessidade de cada um, como já acontece com outros medicamentos. No entanto, isso ainda não é possível.
Entendendo cada caso
Márcia destaca que “quando você individualiza, você explica e torna possível encontrar esquemas alternativos. Criar suas próprias doses é correr risco de vida. As pessoas estão morrendo porque se sentem sozinhos, porque não são acolhidos. Acolher é explicar.”
Assim, a infectologista defende que cada profissional precisa estar atento. “Por isso é importante a união de diferentes médicos para montar o quebra-cabeça. É preciso juntar ginecologistas, psiquiatras, cardiologistas e pensar em saúde como um todo.”
“Há que se pensar que nem tudo é consequência do medicamento para HIV. Tomar antirretroviral com cerveja é melhor do que não tomar. Abuso de álcool, outras drogas ou o fato de a pessoa estar acima do peso geram consequências para a saúde independente do vírus. O que se pode fazer em algumas situações, é adaptar os esquemas de tratamento para que ele se adeque melhor a cada necessidade”, explica Márcia enquanto relembra estatísticas que mostram que o uso de cigarros reduz em até 12 anos a expectativa de vida das pessoas vivendo com HIV.
A questão do dolutegravir também foi apontada como uma das principais dúvidas de mulheres com possibilidade de engravidar. Márcia relembrou que é comum que os efeitos adversos dos medicamentos são vistos posteriormente à liberação de seu uso. Isso acontece porque, devido à sua eficiência e comprovação do benefício, ele gera impacto na mortalidade. No entanto, alguns problemas podem ser vistos depois que o remédio já está sendo utilizado por muitas pessoas.
Neste cenário, Márcia explicou que quatro casos de má formação do tubo neural foram relatados em Botswana. Até as evidências comprovarem o contrário, mulheres que fazem uso do dolutegravir precisam fazer uso de um método contraceptivo seguro.
Jéssica Paula ([email protected])
* O Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas é um coletivo de mulheres brasileiras que vivem com HIV/aids. A Agência de Notícias da Aids cobre o 8º Encontro Nacional das Cidadãs Posithivas à convite do Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais.
Fonte: Agência de Notícias da AIDS