Daria Dal Zuffo

Como é ser mãe soropositiva?
É o que me perguntei por muitos anos, desde que descobri o HIV em minha vida.
Trinta anos de um casamento normal, com três filhos adolescentes, uma vida estável e, de repente, por acaso, aparece o HIV na minha vida. Chega atropelando sentimentos, confiança, certezas.
Os filhos me olhando incrédulos, se perguntando “o que minha mãe, o que meu pai fizeram de errado, para ter Aids?”. Sim, porque 18 anos atrás, ter HIV ou Aids era a mesma coisa.

Na entrega do diagnóstico, resultado de uma doação de sangue, o médico disse: “Vocês têm no máximo, dois anos de vida”. Como falar isso para os nossos meninos? O coração de mãe batendo tão forte que parecia explodir no peito; por que eu? Por que nós? Onde erramos? Minha filha estava esperando um bebê. Será que eu viveria até ele nascer? Será que poderia pegá-lo no colo, beijá-lo, trocar suas fraldas, dar banho?
Será que viveria o suficiente para vê-lo engatinhar, apontar os dentinhos, falar “mamãe”, chamar “vovó”…

Mas o preconceito falou tão alto, quando a secretária do médico divulgou a notícia na cidade, que o medo tomou conta de minha vida. Sem quase sair de casa, engordei 25 quilos, me afastei de amigos, perdi outros tantos, perdi minha estabilidade financeira, perdi o sorriso dos meus filhos, perdi a confiança em meu marido, só me restou contar, dia após dia, quanto faltava para completar dois anos…. e morrer.

Mas os dois anos passaram, passaram três, quatro, e nada acontecia. Não fiquei doente, não morri. Então eu precisava viver… mas viver como? Viver não podia significar para mim, somente o transcorrer do tempo, tentando descobrir no espelho, a cada dia, um sinal de doença, um sinal de que estava chegando o fim. Tinha que fazer algo que servisse para me fazer sentir viva. Meu marido não entendeu assim, se entregou ao sentimento de culpa que o atormentou desde o início e faleceu há nove anos.
Mas eu tinha que fazer algo para que outras mulheres não sofressem tudo aquilo que eu tinha sofrido, para que olhando para mim, descobrissem que se podia viver com HIV e viver bem. Bastava buscar outros valores, outros sentidos, outras amizades, outros objetivos de vida.

E assim foi acontecendo. Aos poucos foram chegando mulheres, que como eu, descobriram que casamento não é sinônimo de fidelidade, proteção, cuidados, amor verdadeiro. E os filhos? Aos poucos foram entendendo que mãe que ama, que cuida, é também vulnerável; que mãe, continua sendo mãe, com ou sem HIV. Hoje, com cinco netos, vivo feliz um dia de cada vez, sem me preocupar até quando… e o dia das mães vou festejá-lo com os meus filhos, meus netos, minhas noras e genros e um novo companheiro que está ao meu lado há cinco anos. Feliz dia das mães para você também, mãe soropositiva!!!!!

 

Fonte: Agência de Notícias da AIDS